quarta-feira, 31 de outubro de 2007

Lapso de um jornalista hoje de manhã na rádio

Désormais, Nicolas Sarkozy en a une aussi grosse que François Fillon.
Meio segundo de silêncio…
Une paie, bien sûr …



(Isto a propósito do aumento de 140% do ordenado do senhor presidente.)

domingo, 21 de outubro de 2007

O passeio da Alfacinha com uma couve nos braços

Vou levar umas flores.
Mal chega à florista… uau, é mesmo isto. A um cantinho, escondidos, estão uns vasinhos com couves bem redondinhas, em tons de verde e roxo.
No segundo seguinte, já vai a Alfacinha a caminho do metro, atrasada, de couve em punho. Sábado à noite, não é a única a passear-se com plantas nos braços. Muitos foram os casalinhos que cruzou no caminho a quem deitou um olhar cúmplice, ele com um enorme ramo de flores a tapar-lhe a vista, ela pendurada no braço dele.
Chega ao metro… oh não, estou feita. Ainda os resquícios da greve, metros atrasados e muita gente à espera… Pobre couve, vai ficar em sopa… Tenho de a proteger!
Ao seu lado, uma senhora: vira-se, olha, sorri e finalmente:
- É uma alface que leva aí ou uma couve?
- Ah, é uma couve, mas de facto parece uma alface.
- Que engraçado!
Está fascinada a senhora. O metro chega, a Alfacinha entra com a sua alface, cuidadinho aí minha gente…
Saio na próxima
. Livra-se a Alfacinha por fim do aperto da carruagem e continua o seu trajecto pelos corredores do metro, enquanto observa a couve, a ver se não sofreu danos. E eis que um senhor de chapéu e barbicha na ponta do queixo se aproxima e:
- C’est le cas de dire: «mon choux»!
Gargalhada da Alfacinha, bem observado, sim senhor, só os franceses para usar uma palavra tão romântica como couve para dizer «minha querida!». Orgulhoso do efeito provocado na Alfacinha, o senhor também se ri.
- Je m’en vais au Père Lachaise maintenant, c’est calme.
- Ah oui, ça, il n’y a pas de doute !
E entram no metro que os levará a ela, à festa, a ele, ao cemitério.
Quando chega ao seu destino, o senhor sai, olha para a Alfacinha, sorri e diz:
- Au revoir mon choux!
Nem sabia ele que falava com uma Alfacinha…!

quinta-feira, 18 de outubro de 2007

Depois da tempestade, o sol?

7h30 da manhã, sai a Alfacinha de casa, encasacada, de luvas e cachecol para enfrentar os quatro graus centígrados anunciados na rádio. Está mesmo frio! Pelo menos não vai chover.
E começa a sua marcha.

Conduzida pelo itinerário traçado no site da Câmara, o mais curto, o mais rápido, lá vai a Alfacinha, de passo apressado para não congelar, muito atenta ao nome das ruas para não se enganar.
Porque não apanhar um táxi? Totalmente, completamente, categoricamente fora da lógica parisiense. Tal ideia não passaria, e de certeza que não passou, pela cabeça de nenhum jovem. Pernas para andar, pernas para pedalar? Pernas, para que vos quero! Ideia comodista, ideia preguiçosa, ideia pouco ecológica, ideia absurda numa palavra, essa do táxi.

Engraçado, ver a cidade a estas horas. À direita da Alfacinha o céu começa a ficar claro, com o sol a despontar. À esquerda, está tudo escuro, como se de noite.
E muita, muita gente na rua. Muita a pé, mãos nos bolsos, andar rápido e decidido. Muita, muita de bicicleta, aproveitando os corredores de autocarros não utilizados. Muita, muita, muita de carro, em filinha.
A esta hora, a cidade é de um silêncio incrível.
Incrível a sensação do amanhecer na cidade, do acordar da cidade, com o ar fresco a entrar pelo casaco e este silêncio.
Zigzagueando pelas ruas aí vai a Alfacinha, de pingo no nariz, «o choque do ar gelado com o respirar», de dedos imobilizados, sempre de mapa nas mãos para não se enganar.
A esta hora, cheira a pão quente por todo o lado. As padarias enchem os expositores, com baguettes, croissants, pains au chocolat, éclairs e outros doces mais voluptuosos, coloridos, de formas arredondadas, daqueles que fazem água na boca. Se pudesse, entrava em todas as padarias… Estaria mal, nesse caso, a Alfacinha, pois teria de parar a cada esquina.
Assim, passa só em frente às montras, comendo com os olhos, e vendo lá dentro as criancinhas que, antes de ir para a escolinha, tomam o seu pequeno-almoço. Atiram-se esfomeadas e deliciadas a um pain au chocolat, enquanto são arrastadas pelas mamãs, depressa que vai estar atrasado.
É a hora das criancinhas que vão para a escola.
É a hora dos senhores de cabelo grisalho ou mesmo branco, com um ar muito intelectual, de óculos redondos na ponta do nariz. É a hora de eles tomarem os seus pequenos almoços, Petit Déjeuner Continental 12 euros, Petit Déjeuner Gourmand 15 euros, Petit Déjeuner Parisien 10 euros, sentados nas esplanadas dos cafés, segurando com uma convicção e um à vontade de habitués, por cima da perna cruzada, um jornal aberto.

40 minutos de marcha. Às 8h10 chega a Alfacinha à sua sala de aulas, cheia de calor, com o nariz a escorrer, pernas a tremer. Tal como a maior parte dos seus colegas. Uns fizeram 45 minutos de bicicleta, outros 1h30 de marcha, outros ainda uns 30 minutos de scooter… E horas de acordar a condizer. Nem me posso queixar!
Turma incompleta, mas as aulas decorrem normalmente.
Durante o dia, vai-se sabendo a proporção da greve. Transportes? Zero. Restaurante universitário? Fechado. Beaubourg? Fechado também. Correios? Serviço condicionado.
Impossível de passar ao lado desta mobilização, apesar da notícia bomba do divórcio entre o Nico Sarkozy e a Cecília.

18 horas da tarde, fim das observações microscópicas de rochas, regresso a casa, mais 40 minutos de marcha, a cidade a escurecer, à medida que a Alfacinha caminha.
Outra vez os carros, as bicicletas, as pessoas. Outra vez um ar fresco, ar fresco de anoitecer. Outra vez os cafés, as esplanadas, com as senhoras a tomar chá, por baixo daqueles enormes postes aquecedores. Outra vez o perfume das padarias, e as criancinhas a lanchar, com as mamãs ao lado a segurar as mochilas. Outra vez as ruas estreitinhas, desta vez com lojas abertas, mais cafés abertos. A descoberta de um café português, com um imenso mural «Benfica campeão» e várias mesas ocupadas por senhores a jogar às cartas. E quase a chegar a casa, a surpresa de encontrar uma colega do Liceu de Lisboa. A surpresa de não se sentir totalmente desenraizada. Mas também a sensação de afinal não se ser totalmente anónima.

Depois da tempestade, o sol?
Talvez não. Parece que a greve vai continuar. Amanhã, nova marcha matinal.
Mas não faz mal. Foi bem bom.

quarta-feira, 17 de outubro de 2007

Prepara-se uma tempestade

Há um ano que a Alfacinha se transplantou para as Franças e ainda quase não tinha tido a oportunidade de assistir às famosas manifestações, greves e outras mobilizações bem características deste povo tão interveniente.
Pois bem, será amanhã.

Há uns dias que não se ouve outra coisa: não sei como vou fazer para vir às aulas na quinta… Combinam-se dormidas em casa de uns e outros, procuram-se soluções de recurso, as bicicletas velib’? impossível de encontrar lugar para as deixar com a afluência…, calculam-se horas de acordar em função de horas de marcha, encolhem-se ombros, tenta-se ser optimista, discute-se a polémica, mas nunca se põe em causa o direito à greve.

O metro vai parar, os autocarros vão parar, os eléctricos, os comboios suburbanos, até o comboio para o aeroporto, até o TGV. Tudo. Só três linhas de metro vão funcionar, a 15%. Todos os sindicatos dos transportes apelaram à greve contra a modificação dos regimes especiais de reforma.

Paris vai estar paralisada.
A França vai estar paralisada.
Mas em grande ebulição.

Bom, terei de contar com os meus pezinhos para ir para as aulas... Espero que não chova! Amanhã: levantar com as galinhas!


segunda-feira, 1 de outubro de 2007

A primeira experiência de Velib'

- E se fôssemos de bicicleta?
- Daqui até à Bastille? Apanhar a Rue de Rivoli, com aquele trânsito todo, autocarros e carros a apitar, não sei…
Sempre a Alfacinha com os seus receios. Felizmente, estava tudo do seu lado: sentido único na Rue de Rivoli, direcção Châtelet.
- Vamos pelo Marais, então.
Uff…
E lá foram estrear as novas bicicletas Velib’, de costas direitinhas, sorriso na cara, cabelos ao vento, a respirar o ar fresco do fim de uma tarde de outono, todas cliché de parisienses em pasteleiras, com um cestinho pendurado na dianteira, a serpentear pelas ruelas estreitas e alegres do Marais.
E lá foram, espreitando a cada esquina, adivinhando o caminho, sujeitas aos sentidos proibidos e obrigatórios, agora para a esquerda, outra vez para a esquerda, mais uma vez… acho que estamos a andar à roda… Nunca tinha a Alfacinha passeado olhando para semáforos, para sinais de trânsito, prioridade à direita, não é?, para passadeiras do lado perpendicular, ai desculpe senhor peão que o ia atropelando!
E foi quando chegaram à Rue Vieille du Temple que a dificuldade do desafio aumentou em flecha: domingo, tarde de jogo do mundial de rugby com a França, fez com que houvesse uma multidão de gente aglomerada no meio da via. Impossível de dar duas pedaladas seguidas. Ora eram criancinhas a correr de um lado para o outro, ora parezinhos abraçados a andar devagar e às curvinhas, ora grupos de amigos arrumadinhos uns ao lado dos outros, ou simples pessoas a atirarem-se, sem medo, para o meio da rua para atravessar, como eu sempre fiz. Pior que uma gincana. O que é que estou a fazer aqui no meio? Como vou sair daqui? Estamos mal… A Alfacinha bem que tentava continuar, mas tinha de andar tão devagar, de fazer curvas tão apertadas e tão rápidas (e com tão pouco jeitinho) que a expedição se começou a tornar verdadeiramente delicada. Eu que estava com medo dos carros… E onde é a sineta desta coisa? Gaita!
Foi muito a custo que conseguiu sair daquela barafunda, deixar a bicicleta na Bastille e pôr-se de novo em cima dos seus pés.
Tenho as mãos vermelhas de tanta força que fiz a agarrar o manípulo…

Aqui estão elas, em todo o seu esplendor, as novíssimas bicicletas em livre trânsito Velib'.