domingo, 16 de dezembro de 2007

Tonio se sent aussi français que portugais

Tôniô Máchádô habitá Paris dechdé vinté ánôch. Vindô párrá gágnárr suá vidá, já tém umá entrréprrisá i séúch filhôch já sáô frráncéséch. Tôniô párrlá múitô dê pôliticá, pôrr issô é évident qué quérr vôtárr nách municipales. Et já féch les démarches párrá tál. Ágôrrá só tem qué convencérr súá femme párrá fázêrr ô mêchmô. Sáô 629 ôch ressortissants dá Union Européenne inchcritôch nách lichtách dô 14º arrondissement.
Et já lá contám á Álfácinhá.
Fôí á mairie dô séú arrondissement, com umá contá dê éléctricidadé, á cártá dê identité et prrontô. Já pódê votarr.
Á ségnôrrá riu-sê muitô com ô nômé dá Álfácinhá et com ô lôcál dé násciméntô. Tévé dê échcrevérr létrá á létrá párrá náô sê enganárr. Á Álfácinhá lá sê vaí hábituándô á suá nôvá identité dê Márriáná Bábô Rrrébélô.
Enfim, apérrtou á máô dá sénhôrrá et vôltô párrá cásá com díréitô dê vôtô.

(À párrtírr dê um ártigô dô Jôrrnál dô 14º arrondissement sôbré ách éléçõench municipales ná Françá. Et áquí áô dessus, Tôniô lui-même.)

sábado, 8 de dezembro de 2007

A Alfacinha vai ao cabeleireiro

Acabada de acordar, olha-se ao espelho a Alfacinha, ai qu’até m’assustei, pois é, na véspera cortara o cabelo.

Atormentada pela infidelidade à sua cabeleireira preferida (tatuada, pierçada, etc.), a Alfacinha decidiu mesmo assim ir cortar o cabelo. Mil desculpas, Cris! Encontrou um estabelecimento para tal efeito perto de casa, novinho em folha, com um ar modernaço: é ali que vou.
E de facto, não só era modernaço como praticava um «novo conceito», hmm novos conceitos, vamos lá ver que história é está… eu só queria mesmo cortar o cabelo, só isso….
Sentaram-na em frente a um espelhinho quadrado e explicaram-lhe o método: tem aqui uma série de palavras e cores, terá de escolher quais a representam melhor; depois, observe as formas de cara propostas e identifique a sua; em seguida, folheie esta revista e diga-nos qual o penteado que prefere. Bom, espero ter decorado tudo!
Começa a virar as páginas do folheto, à procura da palavra que melhor a caracteriza. Fluida? Estruturada? Vamos manter alguma seriedade nisto, Alfacinha, não te rias. Fina? Natural? Sim, é mesmo isso: natural. Estou a ver que isto é sofisticado, vou jogar pelo seguro; se me impingirem colorações eu saio-lhes com esta: ah! natural, lembram-se? Ora cor… Que cor? Porque será que só há tons de cor-de-rosa? Bom, vai este verde, deslavado é certo, mas ao menos não é este cor-de-rosa pindérico.
Próximo passo: forma da cara. Acho que redonda, assim à la bolacha Maria …
Cabeleireiro sofisticado, mas com o bom velho hábito de pôr revistas à disposição. Não resisto. Descobre então que a Britney Spears está a ser pressionada para escrever a sua autobiografia, sem comentários, que o Tom Cruise está a construir um bunker para se proteger de ataques de extraterrestres, que a Nicole Kidman terá feito um enriquecimento mamário (facto demonstrado pela comparação de duas fotografias, o antes e o depois, com círculos e flechas à volta dos ditos órgãos) … Daquelas coisas interessantes e enriquecedoras que se aprendem nos cabeleireiros ou nos consultórios médicos! Está partida de riso a Alfacinha quando chega a menina.
- Então, diga-me qual a sua palavra.
- Natural.
Concentra-se a menina, franze os olhos, olha bem para a Alfacinha, mexe, remexe-lhe o cabelo, põe-se ao nível dos olhos da Alfacinha, do seu lado direito, lado esquerdo, muda de perspectiva…
- Eu diria que a menina tem a cara quadrada, ou rectangular.
Eu!? Quadrada? Rectangular?
Vai então ao folheto…
- Bem, natural corresponde a uma cara triangular, ponta para baixo. Mas não se preocupe, pode se sentir natural mesmo tendo a cara rectangular.

Que alívio, por um segundo receei ter uma personalidade não condicente com a minha cara! Ora, mas que susto.

Visivelmente, a menina ainda não aprendeu de cor as correspondências, senão teria feito uma forcinha para convencer a Alfacinha que a sua cara é triangular…
Deixe estar, com um bocadinho de treino, há de ver que consegue chegar lá.

Ele há com cada uma, de facto… Como é que os cientistas ainda não provaram que a genética da cara determina também a personalidade?
Mas os cabeleireiros sabem. Eles sabem tudo.



(imagem daqui)

domingo, 2 de dezembro de 2007

Como a Alfacinha se "débrouillou" durante as greves

Durou uma semana e meia.
A surpresa deixou de ser surpresa. Só no primeiro dia arregalou os olhos com o mar de gente a cobrir o cais. Se calhar devia deixar de ser preguiçosa, pensar na minha linha, pegar nas minhas perninhas e andar… Mas não, o sono era muito, da primeira vez pode ser, das outras… nem por isso.
Por isso, teve de se adaptar à situação a Alfacinha: mal chegada ao cais, ocupar a linha da frente, esperar o tempo que fosse preciso e mal chegado o metro fazer-se fininha para se conseguir infiltrar na carruagem. Uma vez lá dentro, quase impossível de levantar a mão e coçar o nariz. Se o esmagamento fizesse bem à dita linha, a Alfacinha teria perdido vários centímetros.
Era tanta a lotação das carruagens, que uma vez a ponta do casaco da Alfacinha ficou presa na porta. Era tanta a lotação das carruagens, que uma vez a Alfacinha teve de segurar no seu saco com os braços no ar. Era tanta a lotação das carruagens que a situação se tornava surrealista. Estou colada a pelo menos seis pessoas. E o calor? Literalmente um calor humano… Quantas foram as observações minuciosas que pôde fazer! Esta senhora tem os cabelos espigados, este senhor está cheio de caspa, alguém aqui cheira a naftalina…
E que situação incómoda esta! Guardavam-se pudicamente mãos para não se arriscar toques involuntários e indiscretos, colava-se os pés ao chão para não se perder o lugar…
E que sensação incrível de não precisar de se segurar. Deixar-se balançar com as curvas do metro, sem medo de cair, ser-se amparada por corpos.
E quando se pensava que não cabia nem mais uma agulha na carruagem, pois bem, alguém abre a porta, aperta bem, encolhe a barriga, mais duas ou três pessoas aproveitam, encolhem a barriga, a campainha toca… as portas encravam, as pessoas apertam mais um bocadinho, vá-lá, só mais um bocadinho, e pronto, as portas fecham-se mesmo, uns centímetros a menos de espaço vital para cada um, e lá vai o metro. Oh não, tenho uma tangerina no saco… Espero que não se transforme em sumo…
Houve até quem sugerisse que as pessoas subissem para cima dos bancos! Loucura total quando aperto total.
Na Alfacinha, isto tudo provocava grandes ataques de riso abafados com algum esforço. Mas na maior parte das pessoas, era irritação e nervosismo. Começaram então a aparecer insultos aos condutores de metro nos cartazes publicitários das estações. Automaticamente, apareceram respostas. Um clima já bem tenso, acentuado depois com uma greve da função pública, com a greve dos juízes, e com todos os movimentos estudantis contra uma nova lei sobre o financiamento das universidades.
Vai aqui uma confusão!