terça-feira, 10 de julho de 2007

Vol Air France 2124 à destination de Lisbonne :

A princípio eram três.
O Carlos, homem rijo, muito macho, correntezinha ao pescoço, pelo no peito, bíceps resistentes com marca à camionista. Na sua mão direita, entre o polegar e o indicador, trazia uma tatuagem: Cidana. Cidana, o nome da poderosa brasileira quarentona que trazia pelo braço, está visto que foi baptizada antes da descoberta da Sida!, uma leoa tigresa de vestido decotadíssimo, confundindo-se com a sua pele lustrosa, bem coladinho às suas redondas formas de Michelin. A terceira era a mãe do Carlos, Carlinhos. Saiinha branquinha travadinha, joanete a fugir da sandália fina e um pronunciado sotaque nortenho.
A princípio eram três, a lutar pelos dois lugares ao lado da Alfacinha.
- Fomos os primeiros a chegar e aquela sacana não foi capaz de nos pôr juntos.
- Oh Daninha, mas o teu lugar é já aí na fila de trás.
Tão querido, o Carlinhos, não se quer separar da mamã!
- Ah, mas eu queria ficar do seu lado…
Tão querida, a Cidana, não pode ficar duas horas «longe» do seu Carlos!
- … aqui eu não sento, entre dois homens!
Ah, então era isso… potencial assédio sexual a bordo…
- Oh Daninha, mas senta-te…
- Deixe comigo, Carlos, que eu sei o que estou fazendo.
Arregala o olho a Alfacinha, curiosa para ver como a corajosa e determinada senhora pretendia contornar as normas rígidas do avião. Passados uns minutos…
- Não, não deu…
- Oh Soninha, mas quer que vá para o seu lugar?
Visivelmente, a sogra ainda não encaixou o nome da sua vaporosa nora…
- De jeito nenhum! Entre dois homens!
Vira-se curiosa a Alfacinha para ver quem eram as duas ameaças masculinas. À esquerda um jovem, cara vermelha de tanto abafar o riso, e à direita um chinês gorducho que aparentemente não percebia nada do que se estava a passar.
- Daninha, queres que vá eu?
- Não, deixe.
Ora bolas, devia ceder o meu lugar… Mas imediatamente um risinho maléfico vem aos lábios da Alfacinha: não resisto a uma cena doméstica. E esta, promete.
- Poxa, nem tenho espaço para pousar meus braços… eles ocupam tudo…
- Vê, mãe, o que aturo todo o santo dia. Vida a minha!
- Mas oh Soninha, não quer trocar comigo?
- Não, a senhora fique onde está.
- Agora a culpa há-de ser minha, quer ver? Oh Cidana, isto vai durar as duas horas de voo?
Espero que sim! Está a ficar suculento!
A princípio eram três.
Quando o avião começa a andar, aparece um quarto elemento: uma rapariga nova, cabelos longos L’Oréal e andar balançante, filha de Cidana.
- Ela me pôs bem lá no fundo, na última cadeira em frente ao banheiro. Ali eu não sento.
Agora eram quatro, a lutar pelos três lugares em torno da Alfacinha. Foram então experimentando todas as permutações possíveis de 4 elementos nos três lugares. E de tanto permutarem, conseguiram afugentar o jovem vermelho de riso. Nenhum deles ficou no lugar de origem. Mas ao menos Cidana passou a viagem de mão dada com Carlos que ressonava e a filha de Cidana passou a viagem em amena cavaqueira com a mãe do Carlinhos.


Não resisto a dar um cheirinho da aterragem:
Cidana: Oh meu Santo Deus, meu Jesus Cristo, meu Senhor, segura, meu Deus, segura, por favor segura! Perdoa todos os meus pecados e de minha filha, segura meu Deus, segura meu Jesus Cristo, por favor meu Senhor, segura, seguuuuuuuuuuuuu... O avião pousa… uuuuuuuuraO avião trava… segura, meu Deus, segura, meu Jesus Cristo, perdoa todos os meus pecados e de minha filha!!! O avião pára…
Foi Jesus Cristo que nos salvou!

2 comentários:

Anónimo disse...

LINDO! Enfim...é o país que temos! Agora que és emigra não gozes!! Até os meus pais se renderam ao teu blog.
Adorei ver-te.
Grande beijinho

F. disse...

ahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahah

ahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahhahahahahahahahahahahahahaahahahahahahah